Breve comparação feita pelo político e filósofo espanhol Juan Vázquez de Mella y Fanjul, retirada e traduzida do discurso pronunciado em 23 de abril de 1903 no Teatro Trívoli de Barcelona*
Juan Vázquez de Mella y Fanjul |
O que resta em pé daquela economia miserável que só serviu para produzir catástrofes? Essa economia diz que o capital não é mais que o produto destinado a uma nova produção, quer dizer, um efeito destinado a ser causa que, portanto, necessita de uma causa anterior, que não podia ser ele mesmo, posto que ninguém se dá o ser que não tem; o que prova, ademais, que há riqueza que constitui capital que não é produto, porque não é obra do trabalho dos homens, mas da natureza.
Essa economia diz que o trabalho é uma mercadoria que se regula, como as demais, pela lei da oferta e da demanda; e a economia social católica contesta: não; o trabalho, como exercício da atividade de uma pessoa, não é uma simples força mecânica, é uma obra humana que, como todas, deve ser regulada pela lei moral e jurídica, que está acima de todas as regras econômicas.
Essa economia diz que o contrato de trabalho é assunto exclusivamente privado, que só interessa aos contratantes, e a economia católica contesta: não; o contrato de trabalho é diretamente social por seus resultados, que podem transcender à ordem pública e social, e a hierarquia de poderes da sociedade - e não somente o Estado, que é o mais alto, mas não o único poder - tem, em certos casos, o dever de regulá-lo.
A economia liberal diz que o principal problema é o da produção de riqueza, e a economia católica contesta: não; o principal problema não consiste em produzir muito, mas em repartir bem, e por isso a produção é um meio e a partilha equitativa um fim, e é inverter a ordem subordinar o fim ao meio, ao invés do meio ao fim.
A economia liberal diz: existem leis econômicas naturais, como as da oferta e da demanda, e nas quais, não intervindo o Estado para alterá-las, deduz-se de si mesmas a harmonia de todos os interesses. A economia social católica contesta: não existem leis naturais que imperam na ordem econômica à semelhança das que regem o mundo material, porque a ordem econômica, como tudo o que se refere ao homem, está subordinada à moral, que não se cumpre fatal, mas livremente; e não se podem harmonizar os interesses, se antes não harmonizam-se as paixões que os impulsionam; e a oferta e demanda não é, tampouco, uma lei natural, porque nem sequer é lei, já que é uma relação perpetuamente variável, como são seus extremos, e a lei encontra-se na relação entre as causas que produzem as mudanças, e não no resultado.
A economia liberal diz: a liberdade econômica é a panaceia de todos os males, e a livre concorrência deve ser a lei suprema da ordem econômica. E a economia social católica contesta: não; o circo da livre concorrência, onde lutam os atletas com os anêmicos, é o combate no qual perecem os débeis esmagados pelos fortes. Para que essa contenda não seja injusta, é necessário que os combatentes lutem com paridade de armas e, para isso, é preciso que os indivíduos não fiquem dispersos e desagregados, mas unidos e agrupados em corporações e na classe, para que sejam como suas cidadelas e muralhas protetoras, para que a força de alguns e o poder do Estado não os esmague.
A antiga economia liberal diz, referindo-se ao Estado em suas relações com a ordem econômica: deixai fazer, deixai passar. E a economia católica contesta: não; essa regra não se praticou jamais na História. Os mesmos que a proclamaram nunca a praticaram; e é um erro frequente crer nisso, no qual incorreram muitos e, entre eles, sábios publicistas católicos, por não terem reparado que a antiga sociedade cristã estava organizada espontaneamente, e não pelo Estado. Aquela sociedade havia estabelecido sua ordem econômica não a priori e conforme um plano idealista, mas segundo suas necessidades e condições; e, quando o individualismo encontrou-se com uma sociedade organizada de acordo com princípios contrários aos seus, proclamou a tese de que não era lícito intervir na ordem econômica, o que significou precisamente intervir para derrubar o que existia por meio de uma intervenção negativa, que consistiu em romper um a um todos os vínculos da hierarquia de classes e corporações que lenta e trabalhosamente haviam levantado os séculos e as gerações crentes. Qual intervenção é maior que romper, uma a uma, as articulações do corpo social e desagregá-lo e reduzi-lo a átomos dispersos, para dar-lhe, apesar de si mesmo, a liberdade da poeira, de modo que ele se mova em todas as direções de acordo com os ventos que sopram no topo do Estado?
*Alguns tempos verbais foram alterados, assim como a ordem de poucas orações, para dar maior inteligibilidade ao texto.
A tradição foi corrompida!
ResponderExcluirUm tema que merece aprofundamento com certeza!
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