Não sou um exímio especialista na Crise da Igreja, não sou teólogo ou filósofo, não sou uma fonte dentro da Cúria Romana. Sou apenas um dentre muitos católicos. Não esperem, pois, um artigo repleto de revelações bombásticas, emendado com citações de tratados, encíclicas, verdadeiros calhamaços lidos e anotados; isso é trabalho para os eruditos. Falarei apenas com base no senso comum e, mais que isso, com base naquilo que Nosso Senhor Jesus Cristo, Mestre infalível, Luz do mundo, Caminho, Verdade e Vida deixou-nos no Evangelho.
Comecemos por um ponto inegável, que nem o mais fanático neoconservador pode negar sem, ao mesmo tempo, fechar os olhos para a realidade: a Igreja atravessa uma crise. Não me estenderei sobre o tamanho da mesma, ainda que haja razões inúmeras para crer nela como a maior da História.
Entremos em qualquer templo, deixando de lado a Liturgia em si, e reparemos no que há ali – ou melhor, no que falta. Salvo nos locais privilegiados que possuem construções anteriores à década de 1960, a cena se repetirá: paredes brancas, pouquíssimas ou nenhuma imagem sacra – quando existem, o abstrato faz-se tão presente que fica difícil saber se, na parede, está representado Cristo Crucificado, Verdadeiro Deus e Verdadeiro Homem, ou um super-herói voador ou, talvez, um bicho-pau, colocado ali por algum entomólogo.
Quanto aos vitrais, são de cores únicas, sem desenhos; uma mesa, por vezes com características mais disformes, e horrendas, que os móveis dos modernos apartamentos urbanos, ocupa o local do altar; o Santíssimo Sacramento foi deslocado para a lateral e, se visitado, os poucos fiéis que ainda compreendem a realidade da Eucaristia precisam de aguçada noção espacial para encontrar a capelinha, numa verdadeira jornada para visualizar a pequena luz vermelha acesa. Locais para ajoelhar? Nem sempre: contente-se com uma cadeira.
Externamente, é possível questionar se o conjunto arquitetônico é um templo, um centro de convenções, uma câmara municipal ou uma nave espacial – exceto pela cruz (quando se faz presente), todas as outras características nos fazem duvidar da natureza da construção. Curioso concluir que tamanha deformidade exterior da fé não reflete uma deterioração interior da mesma, não? Mas é nisso que muitos creem; e, se o leitor chegou até aqui, terá que admitir, ao menos, que conhece mais de uma igreja com características no mínimo semelhantes às descritas. Mais: talvez seja um retrato fiel da paróquia que frequenta.
Vê poucas pessoas nos confessionários, mas vê uma multidão na fila da comunhão; vê o sacerdote vestido como um homem comum, algumas vezes parecendo um senhor simpático de camisa, com um crucifixo no pescoço; outros vêm padres imitando, no estilo, o tio do Natal que faz a famigerada piada do pavê. As músicas supostamente litúrgicas não diferem daquelas que seu conhecido protestante escuta e, num extremo – infelizmente frequente – daquelas seculares que você mesmo escuta quando no transporte público ou no momento de lazer, em casa.
Sim, estou usando o simples senso comum, como avisei que faria no começo do artigo. Pense a respeito, e encontrará outros pontos um tanto suspeitos, contraditórios ou claramente errados no estado das coisas; é inegável a crise nesse pequeno cosmo católico que você vive, certo?
Passemos ao nível superior: uma hierarquia que, boa parte das vezes, não se posiciona fortemente contra o aborto, contra a união homossexual, que não permite a celebração da Missa Tridentina na diocese... Você achou estranha a entrada da estátua da Pachamama no Vaticano. E, agora, vê jornais do mundo todo – até os católicos, como a ACN – dizerem que o Papa Francisco defendeu leis de união civil para pessoas do mesmo sexo. O que fazer?
A solução nua e crua dos “tradicionalistas” – e uso o termo entre aspas, pois nada mais somos que católicos que buscam seguir a doutrina de sempre da Igreja, e não monstros embaixo da cama – não é a do desespero e da histeria, como querem fazer crer: afinal, sabemos que o Papado já teve homens dos mais diversos tipos, desde heróis e mártires da fé até estupradores, assassinos e defensores de heresia.
Quem deveria colocar os neurônios para trabalhar e tomar cuidado para não cair num desânimo fatal são os neoconservadores, que precisam de malabarismos para justificar o injustificável e abaixam a cabeça numa obediência por vezes contrária ao ensinamento da Igreja: “Devemos obedecer antes a Deus que aos homens” (At. 4, 19-20 e 5, 29).
Além disso, precisam ignorar o que Nosso Senhor Jesus Cristo mesmo disse: pelos frutos conhecereis a árvore (Mt. 7, 16-20). O que será que fariam eles quando acontecesse a hipótese que São Paulo nos coloca? “Evidentemente que não há outro [Evangelho diferente do que vos preguei], mas há alguns que vos perturbam e querem inverter o Evangelho de Cristo. Mas, ainda que nós mesmos ou um anjo do céu vos anuncie um Evangelho diferente daquele que vos temos anunciado, seja anátema. Como já vo-lo dissemos, agora de novo o digo: Se alguém vos anunciar um Evangelho diferente daquele que recebestes, seja anátema” (Gal. 1, 7-9). Talvez aceitassem um novo evangelho, sob o pretexto de ser um anjo do céu que o promulgou...
Não, os “tradicionalistas” não precisamos nos desesperar e arrancar os fios de cabelo da cabeça por isso; não somos nós que dizemos “não há crise!” ou “interpretaram tal documento/frase erroneamente!”. Devemos simplesmente fazer o que a Igreja sempre ensinou, inclusive no que diz respeito ao Papado e a quem ocupa a Sé de Pedro. Oremos pelo Sumo Pontífice com um coração filial; é nosso grave dever e, quanto mais parecer que o Sucessor de Pedro se desvia, maior será a nossa culpa se não o fizermos.
Para encerrar, vejamos algumas passagens do Evangelho que resumem a posição de todo católico de bom senso:
Em primeiro lugar, a difundida passagem de São Mateus 16, 18: “Eu digo-te que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela”. Nada pode destruir a Esposa de Cristo, ainda que tentem fazê-lo desde o interior. Papas bons e maus se sucederam e assim o farão até o final dos tempos. Jesus é a Cabeça, e Ele venceu a morte; o Corpo também vencerá as investidas infernais, exclamando como o Apóstolo: “Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?” (1 Cor. 15, 55).
Lembremos também da Paixão de Nosso Senhor; o Corpo segue a Cabeça, logo, passa pelos sofrimentos que a atingiram. Façamos como São João Evangelista, com o auxílio insaciável e invencível de Nossa Mãe Imaculada, e continuemos ao pé da Cruz; se a Igreja sofre, sofre por causa dos nossos pecados. E, se muitos a abandonam, recordemos: “Mas tudo isto aconteceu para que se cumprissem as Escrituras dos profetas. Então todos os discípulos, tendo-O abandonado, fugiram” (Mt. 26, 56); São Pedro, o primeiro Papa, negou-O, arrependeu-se e tornou-se glorioso mártir e Coluna da Igreja.
Por fim, reparemos no trecho da tempestade no Mar da Galileia: as ondas eram impelidas por um grande vento contra a barca na qual se encontravam os discípulos, e Jesus adormecia na popa. Aqueles, assustados, acordaram-nO e pediram socorro, e Ele fez a tempestade cessar – antes de reprimir os apóstolos pela falta de fé (Mc. 4, 35-40). Ora, as crises não são tempestades que agitam a Barca de Pedro? As águas a invadem, diz-nos o Evangelho; confiemos, entretanto, que Cristo estará sempre conosco, como Ele mesmo prometeu, até a consumação dos séculos (Mt. 28, 20). Tenhamos fé, e façamos o de sempre.
Viva Cristo Rei, cuja festa se aproxima, e Salve Maria Santíssima, que nos concedeu a arma mais poderosa para todas as crises: o Santo Rosário.