terça-feira, 30 de outubro de 2018

Diretrizes para o católico sob o governo Jair Bolsonaro

Em meio ao otimismo exacerbado dos neoconservadores e do medo histérico e coletivo da esquerda, sigamos a Igreja, nossa Mãe e Mestra


Bolsonaro visitou o arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Orani Tempesta, no dia 17 de outubro e firmou compromisso com os valores católicos

No último domingo (28), dia de Cristo Rei no calendário litúrgico tradicional, o Brasil assistiu, tenso, uma histórica eleição. De um lado, Jair Bolsonaro (PSL), candidato sem o apoio da grande mídia, achincalhado pela esquerda, com poucos recursos financeiros para bancar a campanha, reforçando os valores da família, da vida, da propriedade privada, da subsidiariedade - “mais Brasil, menos Brasília” – e falando sobre Deus acima de tudo. Do outro lado, Fernando Haddad (PT), com um plano de governo bolivariano, totalitário, destruidor da família, aniquilador da vida humana pela promoção do aborto, louvado como tolerante e sob as aparências de bom moço. 

As urnas deram a vitória ao primeiro, acabando com a hegemonia da esquerda no poder que já durava décadas, numa falsa alternância entre a centro-esquerda social-democrata PSDBista e a esquerda populista petista. Os revolucionários reagiram com a histeria de sempre: “vai ter luta, seremos resistência!”. Aparentemente, o sistema democrático só é saudável e bom se elege alguém alinhado às suas ideologias pérfidas. 

O brasileiro, povo cujo conservadorismo católico e ibérico ainda está moribundo, aos poucos desperta. Entretanto, observando a euforia dos setores mais à direita e a histeria daqueles à esquerda, decidi escrever o artigo presente, destinado aos irmãos de fé, mas certamente não desprezível aos demais, a fim de apontar e ponderar fatos que passam despercebidos em momentos de apaixonado calor político. 

Em primeiro lugar, é preciso considerar que a esquerda obteve algum sucesso eleitoral: 47 milhões de votos, governadores no Nordeste, a maior bancada da Câmara (PT). Em geral, vimos o establishment seriamente prejudicado após a votação; mas é fato que a esquerda atrapalhará o novo presidente de todas as formas possíveis, com audácia e utilizando-se de variados artifícios. Além do mais, vemos hoje a formação da esquerda do futuro, representada em grande parte pelo PSB e pelo PDT, ambos integrantes do Foro de São Paulo. 

Em segundo lugar, muitos atribuem o fenômeno Bolsonaro a um ou outro personagem, idolatrando líderes que, apesar do papel que desempenharam, estão um tanto distantes do que a Doutrina da Igreja, social, econômica e politicamente falando, prega, e estão igualmente distantes da realidade histórica e sociológica do Brasil, inspirando-se num conservadorismo anglo-saxão que é, em inúmeros pontos, diametralmente oposto às nossas raízes católicas e lusas. 

Em terceiro lugar, faz-se necessário dizer que Bolsonaro está cercado por liberais e maçons. Se o comunismo foi veementemente condenado pelos papas, o liberalismo e maçonaria também foram, e de maneira clara: Gregório XVI, Pio IX, Leão XIII, São Pio X o fizeram através de numerosas encíclicas; diversos prelados e sacerdotes, como o pe. Henri Delassus e pe. Félix Sardá y Salvany, escreveram obras magistrais sobre o tema, além de inúmeros leigos de boa reputação. Convenientemente, boa parte da direita dita católica parece olvidá-los. 

É verdade que o governo Bolsonaro possivelmente dará mais espaço aos católicos, ainda que sob os auspícios liberais. O que os católicos fiéis à Sã Doutrina devem fazer para aproveitar a oportunidade, sem caírem na cegueira demasiadamente otimista ou na histeria? Trago abaixo meras sugestões de ação. 

Antes de qualquer coisa, o católico deve estar consciente de que a oração e a vida espiritual são anteriores à atitude exterior. Somos meros instrumentos de Deus e devemos estar unidos à Sua Santa Vontade, o melhor que pudermos. Decerto a batalha de Lepanto teria um resultado catastrófico se a armada católica tivesse confiado mais em suas próprias forças que em Deus, através do Santo Rosário. Mais ainda: a corrupção de um dos membros do corpo é prejudicial ao todo; a mão é deficiente se lhe falta um dedo, ou se o mesmo tem suas funções reduzidas por ferimentos. Assim, a vida na graça é essencial. Comecemos a transformação do país pela transformação de nós mesmos, pois, mais que uma crise política e econômica, passamos por uma crise moral, verdadeira crise de santos. 

Devemos manter a vigilância, primeiramente interna, para evitar a confusão que o pecado causa na alma, tal qual o navio em mar tempestuoso. Externamente, a vigilância se dará no combate às mentiras. Os inimigos da Fé e da Pátria nunca descansam. Uma ilustração disso é a insistência no tocante ao aborto pelas mais distintas vias, especialmente a judiciária. A eleição está ganha, mas a guerra perdura: a esquerda precisa ser respondida sem subestimá-la, nem sempre com chavões e piadas, mas com a inteligência e obras profundas, e os liberais, num futuro não muito distante, também necessitarão de contraponto. O país precisa de uma elite intelectual católica que conheça seus inimigos, e mais: que conheça o Brasil. Ademais, são as elites que governam as nações. 

Assim, cabe ao católico já firme na fé estudar a doutrina comunista e a liberal, conhecendo o modus operandi de ambas, tendo em mente que o liberalismo conquista espaço nas leis e na sociedade por um movimento por vezes imperceptível, alterando seu propósito conforme o nível de degradação daquele povo: da separação Igreja X Estado veio a separação Igreja X família e agora Igreja X indivíduo; do casamento como mero contrato veio o divórcio e a posterior aceitação da união homossexual; da liberação de meios anticoncepcionais artificiais veio a liberação do aborto; etc. Também importa ao católico brasileiro estudar seu próprio país, sua história e sua cultura. Há bons autores que caíram no quase esquecimento, entre eles José Pedro Galvão de Sousa e João Camillo de Oliveira Torres. 

Cabe igualmente aos católicos, especialmente aos representantes eleitos e aos integrantes dos vários centros formados e em formação, aproximar as propostas inspiradas no ensinamento da Igreja das figuras públicas, a fim de influenciar diretamente o governo. Não podemos ser apáticos, como alguns quiseram ser no período eleitoral, abstendo-se do apoio ao mal menor. Além disso, como o Reinado Social de Nosso Senhor Jesus Cristo depende de uma estrutura com base sólida para atingir o topo posteriormente, é necessário pensar em iniciativas de catequização do povo, ludibriado por um clero em larga medida conivente com a destruição das almas, para que conheça a Sã Doutrina, e colocá-las em prática desde logo. 

Tenhamos sempre em mente que Nosso Senhor Jesus Cristo é Rei e devemos dar o que Lhe pertence por direito, como Criador de todas as coisas, sendo Homem-Deus, e por conquista, uma vez que resgatou-nos pelo Seu Preciosíssimo Sangue. Não é, portanto, a construção de uma situação nova e que os inimigos chamam de utópica, mas o justíssimo reconhecimento do que já existe. Animados pela confiança inabalável na Santíssima Virgem de Aparecida, padroeira da nossa amada nação, não cansemos de lutar pelos direitos de Deus em um mundo cada vez mais inundado de laicismo e das falsas liberdades e falsos direitos do homem. 

P. S.: Não nos esqueçamos de, assim como rezamos pela derrota do mal iminente nas eleições, colocar dia após dia em nossas preces o novo governante do Brasil, Jair Messias Bolsonaro, e todos os demais parlamentares e governantes eleitos.



domingo, 28 de outubro de 2018

Para que Cristo reine

Artigo do mártir e beato cristero Anacleto González Flores sobre a Festa de Cristo Rei


Hoje é celebrada em todo o mundo católico a festa de Cristo Rei. Essa festa foi estabelecida para que Cristo volte a reinar totalmente na vida pública e social dos povos; porque os defensores do laicismo vêm trabalhando há mais ou menos três séculos para suprimir Cristo da vida pública e social das nações. E, desgraçadamente, têm avançado muito, até o ponto de as legislações, os governos e as instituições dos povos se absterem de reconhecer a supremacia de Cristo.

De uma maneira especial, o laicismo tem alcançado em nosso país fortes e grandes vitórias. [O México, na época, após um longo período de revoluções de esquerda, era liderado pelo presidente Plutarco Calles, um laicista convicto, aliado da maçonaria e socialista. Ele criou uma legislação intransigente para com o clero e restringiu a liberdade religiosa dos católicos, levando estes a pegarem em armas na Guerra Cristera].

Afastaram Cristo das leis, das escolas, dos parlamentos, das cátedras, da imprensa, da via pública, em uma palavra, de todos os pontos dominantes da vida pública e social. E trata-se de restabelecer, hoje, o reinado público de Cristo, sobre os despojos do laicismo totalmente fracassado como sistema de vida, de política, de governo e de orientação para os povos.

A importância da festa de Cristo Rei não está somente em proclamar – como será feito – Cristo como Rei Soberano da vida pública e social. Não, porque se a proclamação da realeza de Cristo é algo extremamente importante, mais importante ainda é que nós católicos entendamos as nossas responsabilidades ante o reinado de Cristo.

Porque Cristo não necessita de nós para fundar seu reino e para expandi-lo por todo o mundo; mas se não necessita de nós nem de nossas vidas, deseja, porém, estabelecer seu reinado por meio de nossos esforços, das nossas lutas e das nossas batalhas. E isto deve ser enfatizado hoje, porque se os católicos continuarmos desorientados nesse ponto, correremos o perigo de que jamais se estabeleça o reinado de Cristo em nossa Pátria.

Devemos, pois, entender que Deus, que Cristo pede, exige, quer que cada um de nós, na medida de suas forças, trabalhe veementemente para estabelecer Seu reinado na vida pública, e se continuarmos acastelados em nossas igrejas e em nossos lares, não conseguiremos isso.

O reinado público de Cristo exige que nós, católicos, façamos sentir a ação do nosso pensamento, da nossa palavra, da nossa caneta, dos nossos trabalhos de organização e propaganda. E isso deve ser feito na vida pública, em pleno sol, em plena via pública, em todas as direções; e deve ser feito por todos.

Porque todos, absolutamente todos os católicos, podemos e devemos fazer algo para restabelecer o reinado de Cristo; uns de uma forma, outros de outra; uns com seu talento, outros com seu esforço; mas todos devemos procurar desde hoje fazer algo sério, constante e coordenado pelo restabelecimento do reinado público de Cristo.

Hoje proclamamo-lo Rei, reconhecemo-lo como Rei; mas precisamos jurar que deixaremos nossas velhas atitudes de múmias de sacristia e de mortos-vivos em nossos lares, e que a partir deste dia glorioso faremos com que todas as forças católicas desemboquem na via pública para que Cristo reine na imprensa, no livro, na escola, nas organizações, nas instituições, em uma palavra: no meio do coração do povo e no meio de todas as correntes da nossa vida pública e social.


+ CHRISTUS VINCIT, CHRISTUS REGNAT, CHRISTUS IMPERAT! VIVA CRISTO REI! +



quarta-feira, 10 de outubro de 2018

O que é patriotismo?

Definição extraída do Dicionário de Política, por José Pedro Galvão de Sousa, Clóvis Lema Garcia e José Fraga Teixeira de Carvalho

É o amor à Pátria.

Brota espontaneamente e é ditado pela lei natural. Ama -se a Pátria na mesma linha do amor à própria família. Porque nela palpitam sentimentos comuns traduzidos em laços que prendem as pessoas por habitarem o mesmo chão, falarem a mesma língua, defenderem a mesma cultura, viverem a mesma história. Todo um patrimônio espiritual, constituído pelas gerações que se vão sucedendo, toma a Pátria um lar comum, onde as lutas, as dores, as alegrias, testemunham um amor em que se mesclam respeito e veneração, gratidão e sacrifício, dedicação e imolação. Prolongamento da família, a Pátria fraterniza as pessoas, que sentem, mais do que percebem, a importância de manter vivo o ideal de assegurar, proteger e engrandecer a terra do próprio nascimento, onde se pode sonhar e pugnar por viver com dignidade. Na defesa desse ideal, o amor à Pátria chega ao extremo do holocausto da própria vida. 

No 2º século do Brasil, a Pátria nascente fremia no peito daqueles combatentes - brancos, negros e índios - que, ao canto da "Salve Rainha", enfrentavam o invasor holandês, usurpador da terra e da Fé, na Bahia e em Pernambuco. É a Pátria que ilumina, rege e dignifica a carreira das armas, fazendo do patriotismo a virtude maior do militar. 


Batalha dos Guararapes (Victor Meirelles, 1875-79)


O amor à Pátria é vigilante, está atento às manifestações e à movimentação de seus inimigos. Dentre estes, o marxismo, quer na etapa medial socialista, quer na etapa final comunista, é o corrosivo mais eficaz do sentimento de pátria. Para o marxismo só existe a pátria ideológica, sendo as pátrias vivas meras reminiscências de elos familiares primitivos que devem ser destruídos para dar lugar ao internacionalismo. O individualismo e o anarquismo são duas facetas de um outro inimigo, o egocentrismo, que leva a instalar-se nos próprios apetites, e incapacita para ver e sentir o bem comum da Pátria. Inimigo é também o partidarismo, encharcado de voracidade pelo poder, ao sectarizar o patriotismo – que independe de facções - a fim de capitalizar forças com vistas a alcançar vitórias eleitorais. O amor à Pátria, por deitar raízes no essencial e perene, transcende os ideologismos, os egoísmos, os sectarismos. Funda-se a legitimidade do patriotismo em valores entroncados no ser do homem, que permanece imutável. Daí a perenidade do amor à Pátria, que em certos países da Europa parece morto, mas na verdade enlanguesce sob a mortalha do consumismo e do hedonismo, aguardando a hora de ressurgir. Porque, na verdade, tão natural é o amor à Pátria, que chegou a pungir no coração humano de Jesus Cristo, quando, contemplando Jerusalém, chorou ao antever-lhe a destruição. 

Leão XIII (Papa, de 1878 a 1903), na encíclica Sapientiae Christianae, afirma com todas as letras: 
"A lei natural ordena-nos que amemos com amor de predileção o país em que nascemos e nos educamos." 
E detalha Ramiro de Maeztu (1874-1936), a respeito do patriotismo: 
"É insuficiente o patriotismo que se refere apenas à terra e aos compatriotas, embora seja muito proveitoso estimulá-lo quanto possível. Será coisa excelente que os homens se enterneçam com a lembrança da paisagem natal, acreditem serem as mulheres de sua terra as mais belas do mundo, ponham toda a confiança na honradez e virtudes de seus patrícios, estejam certos de não haver alimentos comparáveis aos de sua região. Também são valores os valores biológicos, que contribuem para a felicidade dos povos. Poder-se-á mesmo dizer que com a consciência de tais valores se forma o patriotismo da pátria pequena, da terra natal. Mas o que forma a pátria única é · um nexo, uma comunidade espiritual, que se torna, ao mesmo tempo, um valor de História Universal" (Defensa de la Hispanidad, Madrid, 2ª ed., 1935, p. 235). 
Comum, entre os espanhóis, é a expressão patria chica, pátria pequena, "patriazinha" - como se encontra no texto de Maeztu – para significar o lugar, o povoado, a cidade, a província, a região, onde se nasce. Na verdade, a germinação primeira de afetividade ocorre e se desenvolve na convivência inicial com vizinhos e avizinhados, num torrão pequeno. É o amor à "pátria pequena", que se amplia, depois, envolvendo a "pátria grande". 

Não há confundir patriotismo com chauvinismo, que o deforma. ao promover uma exaltação desmedida de tudo quanto se refere à própria pátria, apoucando e menosprezando o que concerne às demais. Como o amor à pátria é inerente a todo homem, a sensatez manda respeitar as outras pátrias e o sentimento patriótico dos outros. Até mesmo porque o patriotismo não exclui o universalismo, que implica procurar caminhos de fraternização que levem as pessoas a cooperar na dignificação da vida humana em todos os quadrantes.

Non praevalebunt: as agitações na Barca de Pedro e o “tradicionalismo”

"A Tempestade no Mar da Galileia", de Rembrandt Não sou um exímio especialista na Crise da Igreja, não sou teólogo ou filósofo, nã...